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Sunday 21 January 2024

A Empatia. -  Parte 1



Longe de ser uma mera identificação de sofrimentos, é uma habilidade complexa que vai além da simples ideia de sentir exatamente o que outra pessoa sente.

Cada indivíduo molda suas emoções por meio de interpretações únicas durante o seu desenvolvimento, uma experiência construída com base nas intensidades dos acontecimentos, potências emocionais pessoais e diversas relações ao longo da vida.

Embora seja comum associar a empatia à vivência do mesmo sofrimento daquele que está passando por uma situação difícil, acreditando que quanto mais profunda a emoção e o sofrimento experimentados, maior seria o grau de empatia, essa concepção é, na verdade, um mito.

Em primeiro lugar, empatia não é identificação com dores emocionais, a verdadeira empatia não está intrinsecamente ligada ao sofrimento, mas sim à identificação e compreensão do outro. Pode ser alegria, como pode ser sentimento de aventura, ou qualquer sentimento vivenciado.

Contudo, a dor chama a atenção, estabelecendo um terreno mais comum as pessoas empáticas.

O empático estabelecerá paralelos para compreender as dores ou felicidades entre ele e outra pessoa. Esse esforço é, de fato, uma construção. A pessoa empática busca dentro de si materiais feitos com vivências marcadas por experiências emocionais similares, na tentativa de construir um sentimento aproximado, visando conectar suas percepções com as perspectivas de quem recebe a empatia.

No entanto, é importante destacar que essa tentativa, por mais genuína que seja, não terá sucesso completo, já que ter o mesmo sentimento é uma ideação. A construção da empatia é, portanto, um processo contínuo.

Empatia, nesse contexto, não se trata de uma imersão no sofrimento alheio, mas sim de uma busca ativa por identificação e compreensão das experiências do outro. Ao desvincular a empatia do mito do sofrimento equivalente, abre-se espaço para uma compreensão mais ampla e saudável dessa habilidade.

Isso envolve o reconhecimento das nuances das emoções alheias, a compreensão de perspectivas diferentes e o estabelecimento de conexões baseadas na compreensão mútua, sem a necessidade de vivenciar as mesmas intensidades emocionais.

Essa abordagem mais equilibrada permite ao empático contribuir para o bem-estar do outro de maneira construtiva e respeitosa.

Empatia, portanto, é a capacidade de construir uma realidade paralela, comparativa e associativa de nossos próprios sentimentos aprendidos ao longo da experiência.

Não se trata apenas de identificação, mas de mergulhar na perspectiva do outro, mantendo a consciência de que a vivência é pessoal e única.

Breve, parte 2

Paul

 

Saturday 20 January 2024



Negociar, vender, ou trabalhar em projetos. 

O que diz nosso cérebro?

A economia energética importa.

O cérebro está constantemente preparado para realizar cálculos, pois fazemos isso o tempo todo, somando e subtraindo, ponderando vantagens e desvantagens. A nível cerebral, nem sempre é necessário estar consciente desse processo. Quando alguém nos apresenta algo, seja uma ideia, uma proposta de venda ou uma negociação, esse processo ocorre de maneira automática. Calculamos tudo porque o cérebro tem uma aversão a gastar energia, e quando o gasto de energia é inevitável, mecanismos de alerta, como memórias relacionadas a gastos energéticos, são ativados.

A eficiência do cérebro na utilização de recursos e formação de memória envolve a interação de várias regiões, como o hipocampo[i] para a consolidação da memória e o córtex pré-frontal[ii] para funções executivas. Neurotransmissores[iii], como a dopamina, desempenham um papel importante no reforço e na motivação, contribuindo para a alocação eficiente de recursos.

Esta matemática energética ocorre em uma região especializada do nosso cérebro, responsável por fazer previsões e antecipar resultados. Essas predições, abrangendo fatos do presente e do futuro, são elaboradas pelos gânglios basais[iv] e o córtex pré-frontal, que formulam resultados com base em padrões previamente aprendidos.

Dessa forma, as redes neurais se desenvolvem ao longo do tempo, possibilitando que o cérebro antecipe eventos e faça previsões. Esse processo demonstra a capacidade adaptativa do cérebro em reconhecer padrões, aprender com experiências passadas e aplicar esse conhecimento para antecipar eventos futuros.

 

Ao esforço, recompensa.

Além disso, quando nos deparamos com situações em que o esforço é necessário, podemos experimentar sensações negativas, desmotivando-nos a dar o próximo passo, seja individualmente ou em grupo.

Sempre que o cérebro recebe uma recompensa, a dopamina entra em cena, formando uma memória daquilo que é possível obter. Em negociações, ideias e vendas, a dopamina desempenha um papel crucial após a obtenção da recompensa, tornando essas atividades fontes perpétuas de energia para o cérebro.

A inibição da dopamina pode resultar em uma diminuição da capacidade do cérebro em experimentar e buscar recompensas, levando a uma predominância da resposta de aversão ao perigo. Esse desequilíbrio pode ter diversas implicações, incluindo alterações no estado de ânimo, motivação e na forma como o cérebro processa estímulos emocionais.

Isso ocorre porque o cérebro associa a obtenção de recompensas a uma eficiência energética e benefícios subsequentes. Essa dinâmica cria uma expectativa contínua de recompensa, impulsionando a motivação. Portanto, é fundamental considerar essa interação neurobiológica ao abordar pessoas com novos conceitos ou desafios.

 

Emoções de qualidade fazem diferença.

Outra energia importante é a potência emocional. O sistema de aceitação ou negação de uma nova ideia, está sujeito a fatores binários, isto é, um ou zero, sim ou não. No entanto, para que o cérebro transmita essa informação, muitas vezes inconsciente ou pré-consciente, ou seja, formada meros segundos antes do raciocínio consciente; será a base sobre a qual você vai pensar e depende da incorporação das memórias emocionais.

O processamento emocional tem início na amígdala[v] e se estende até o córtex pré-frontal para regulação consciente. O córtex pré-frontal ventromedial[vi] desempenha um papel crucial na tomada de decisão emocional e na autorregulação. As experiências emocionais moldam as respostas habituais, contribuindo para a autorregulação.

Se aquilo que ouvimos, recebemos e compreendemos não possui uma carga emocional equilibrada, regulada e positiva, tendemos a considerá-lo como perigoso, problemático ou irrelevante. Em outras palavras, o que é oferecido, tanto por nós quanto para nós, deve conter um estímulo emocional saudável e fundamentado em bases positivas. É necessário algo que nos emocione positivamente, incentivando-nos a participar ativamente.

 

Segurança e conforto é saúde cerebral.

E o que caracteriza uma emoção positiva equilibrada? É aquela que não dispara alarmes. Isso ocorre quando estamos envolvidos em interações interpessoais onde o principal alerta sempre se relaciona à economia do benefício, ou seja, ao conforto. O que nos proporciona conforto? O que nos faz sentir seguros? O cérebro realiza esse equilíbrio para compreender qual será a situação futura.

A busca por segurança e conforto envolve a ativação de áreas cerebrais como o estriado ventral[vii], responsável pelo processamento de recompensas, e o córtex cingulado anterior,[viii] utilizado na avaliação de riscos. Essas motivações são frequentemente influenciadas por um delicado equilíbrio entre a detecção de ameaças pela amígdala e as decisões racionais do córtex pré-frontal.

Se o que tenho pela frente não oferecer claramente segurança e conforto, o processo fica comprometido na formação da economia cerebral. O resultado é que ninguém adere à ideia ou ao que quer que seja proposto.

Outra emoção fundamental que integra o grupo das emoções equilibradas é a empatia.

 

A empatia trabalha entre a razão e a emoção.

A empatia é a habilidade de estabelecer uma conexão entre o que a pessoa sente e o que nós sentimos, constituindo uma espécie de estimativa própria. Em um grupo de pessoas, naturalmente, tendemos a compreender os sinais e expressões de cada indivíduo em relação ao que está diante deles, especialmente em situações nas quais também estamos envolvidos.

Se percebemos que o comunicador não se preocupa com elementos importantes para a nossa avaliação emocional, nenhum padrão de empatia é estabelecido. Tanto em grupo quanto individualmente, atuamos como verdadeiros radares, captando expressões ou atitudes empáticas.

A empatia está associada às atividades dos neurônios espelho[ix], especialmente na ínsula[x] e no córtex cingulado anterior. No contexto grupal, a empatia muitas vezes está ligada à liberação de ocitocina[xi], sendo esta responsável pela conexão positiva e duradoura, promovendo o vínculo social. A ausência de um comunicador verdadeiramente empático pode desequilibrar o conjunto de emoções necessárias para a concretização de um objetivo. O comunicador pode ser o produto, a negociação, o projeto, ou mesmo o interlocutor.

 

Algo justo, veste bem.

Grandes dificuldades de negociar aparece quando algo não parece justo.

A percepção da justiça é uma das memórias mais antigas no desenvolvimento de cada indivíduo; certamente, ela tem início na infância e armazena todos os padrões possíveis relacionados a ela, à pessoa, à família e à sociedade circundante.

No painel onde estão localizados os sensores da percepção, um dos principais botões sensíveis é o botão da injustiça.

A percepção de justiça está intrinsecamente ligada ao sistema de recompensa do cérebro, com o estriado ventral[xii] respondendo positivamente à percepção de justiça. A injustiça ativa regiões cerebrais associadas a emoções negativas, como a ínsula anterior, que é o centro de grandes problemas no comportamento negativo. A dissonância cognitiva, que ocorre quando uma pessoa vivencia conflitos entre suas crenças, atitudes ou valores, pode desempenhar um papel definitivo na maneira como os indivíduos conciliam suas crenças sobre justiça.

A crença na equidade representa um aspecto fundamental no contexto da percepção de justiça. Indivíduos que possuem essa crença acreditam na importância de tratamento justo e igualitário para todos os membros da sociedade, independentemente de suas diferenças individuais.

Essa crença na equidade está intrinsecamente ligada aos sistemas cognitivos e emocionais do cérebro. O estriado ventral, componente do sistema de recompensa cerebral, frequentemente responde positivamente quando percebemos situações que refletem equidade e tratamento justo.

Coisas equitativas e justas, vendem mais, projetos são melhores e mais confortáveis, negociações são recebidas com tranquilidade.

 

Autonomia fundamenta o respeito pessoal.

Outra característica positiva é a autonomia. Passamos a vida buscando nossa autonomia. Desde o nascimento, o desejo de andar sozinho, comer sozinho, vestir-se, ter nosso próprio quarto e pertences direciona-se para a construção de um sentimento de propriedade, pessoalidade e unicidade em nosso cérebro.

Qualquer coisa que ameace nossa autonomia é percebida como perigosa, indo contra tudo o que meu cérebro aprendeu.

A autonomia está intrinsecamente ligada às funções executivas do córtex pré-frontal e ao senso de controle associado ao estriado. A perda da autonomia pode ativar vias relacionadas ao estresse, incluindo o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA)[xiii], resultando em respostas emocionais e fisiológicas.

A perda da autonomia gera um sentimento de incapacidade e indignidade, conjunto de emoções extremamente negativas que não dependem de uma decisão consciente para serem controladas; elas ocorrem devido ao funcionamento do sistema cerebral mencionado anteriormente.

Em contextos grupais, um projeto desprovido de autonomia está fadado ao fracasso, beneficiando apenas um lado.

 

Tudo é sempre medido.

Num contexto mais prático, fica evidente que nunca devemos negociar, apresentar ou vender algo que não proporcione economia de tempo, recursos e energia. A premissa de que essas atividades devem contribuir para a eficiência e a economia é respaldada pela forma como o cérebro busca constantemente maximizar benefícios enquanto minimiza gastos. Ao adotar essa abordagem, não apenas melhoramos as chances de sucesso nas interações, mas também alinhamos nossas ações com os processos adaptativos do cérebro, promovendo resultados mais sustentáveis e benéficos.

A conservação de energia, a memória qualitativa, a regulação de emoções saudáveis, a autonomia, a empatia, a justiça e a equidade, bem como a sensibilidade à segurança e ao conforto, representam todos os aspectos positivos fundamentais. Esses elementos são essenciais para que o cérebro tome decisões rápidas, acertadas e eficientes.

Para alcançar o sucesso, é importantíssimo ter em mente que estes não são apenas conceitos abstratos, mas sim as formas pelas quais nosso cérebro responde à sua mecânica intrínseca. Essa resposta não está sujeita a mudanças baseadas em conceitos, coisas que possam ser aprendidas em um curso qualquer. Mas sim, são uma característica inerente ou funcionamento natural do cérebro e consequentemente à formação da mente humana.

A formação do pensamento e da atitude pode variar em níveis, intensidade e profundidade, mas ocorre dentro dos parâmetros das funções cerebrais. O processo é guiado por essas funções fundamentais que constituem a base da cognição humana.

Ao promover, negociar ou persuadir outros a participarem de algo, considerar essas ferramentas aumentará significativamente a probabilidade de sucesso. Sinta-se à vontade para experimentar e aplicar esses princípios em suas interações cotidianas.

Paul.

 



[i] O hipocampo é uma parte crucial do cérebro que desempenha um papel essencial na formação de memórias, transformando lembranças de curto prazo em memórias duradouras. Além disso, ele está envolvido na orientação espacial. Se danificado, pode causar dificuldades na criação de novas memórias. O termo "hipocampo" vem do grego, significando "curva embaixo", referindo-se à sua forma. Este componente cerebral também influencia emoções, ajuda a controlar o estresse e contribui para a adaptabilidade do cérebro ao longo do tempo. Resumindo, o hipocampo é vital para a memória, aprendizado e outras funções cognitivas complexas.